Depois do post de ontem, sobre o "outro homem da minha vida" e a poetisa Florbela Espanca, lembrei-me que nunca tinha escrito sobre a paixão do meu pai pelas mulheres. Não sendo um homem particularmente bonito era, sem dúvida, um homem muito interessante (tinha uns olhos lindos: castanhos escuros, grandes, "pestanudos" e tão expressivos! E tinha as orelhas mais lindas do mundo inteiro!!!). Digo que não era particularmente bonito, pelas fotografias da época, mas esta é uma avaliação pessoal. Tinha uma presença forte, fortíssima, jamais passando despercebido fosse onde fosse. Educado numa época onde a educação marcava a diferença de classes, o meu pai parecia um "Lord" quando estava para aí virado! Tinha uma inteligência bem acima da média e uma sede de aprender imensa. Aprender sobre tudo, desde o cultivo da batata, à criação de enguias, como fazer pão, arranjar lampreias, passando pelos estudos sobre o Copérnico e o Galileu, o curso de medicina e o de arquitectura...
Filho de uma família da burguesia industrial do início do Séc. XX, teve a melhor das educações: tanto em casa como nos colégios que frequentou. Os meus avós não pouparam na educação do filho. Tanto mais que, quando perceberam que o indicado para ele era a educação dos Jesuítas, mandaram-no para Espanha, para La Guardia, onde frequentou o Colégio*, até "fugir" para a Bélgica!
Voltando à sua paixão pelas mulheres, o meu pai era, à época, considerado um D. Juan! Muito embora eu já o tenha conhecido com bastante idade, consigo identificá-lo perfeitamente com a personagem... o meu pai tinha alma de conquistador. O meu pai era um conquistador! Mesmo com muita idade, manteve algumas das características de um bom conquistador (mais uma vez, é uma avaliação puramente pessoal!): um sorriso lindo, um ar de "sacana" fabuloso, uma conversa onde o mel escorria, uma educação primorosa e uns "olhares" que, se conquistavam a filha, imagino as mulheres!!! E, se a educação e a conversa se podem aprender, o sorriso lindo, o ar de "sacana" e a forma de olhar, nascem com as pessoas, jamais se aprendem. Aprende-se, quando muito, a fazer uso deles. E isso, o meu pai aprendeu muito bem! Se estas palavras estão carregadas de orgulho? Sim, estão! Muito embora eu não concorde com a ideia de um homem ter várias amantes, era comum, na época. Aliás, atrevo-me a dizer que era quase um sinal de classe, de estatuto social elevado, pois só quem tinha dinheiro podia manter outras mulheres! São muitas as histórias do meu pai com as mulheres, eu apenas sei algumas contadas por ele e, outras sussurradas por amigos dele... Não viveu o suficiente para a filha o questionar sobre "assuntos do coração"!
É celebre a história da Mimosa e do seu bandolim, a história da filha da "Bruxa" da Adémia, a história da "prima" Amália (sim, essa, a Rodrigues!) e, claro, a da Florbela Espanca (até certa altura, parece-me que o meu pai só escolhia mulheres mais velhas!). Existem, com certeza, mais, mas estas são as que ele confirmou, quer porque as contou à minha frente, quer pelo seu olhar sonhador, embevecido e saudoso que fez, quando as contaram ao pé dele...e que eu pude apreciar!
Algumas destas histórias coincidem com o primeiro casamento do meu pai, outras são da sua juventude e existem, com certeza, histórias da época da sua viuvez. Também existe uma história da época do casamento dos meus pais... pois!!! Mas aí, a minha mãe, que é a pessoa mais ciumenta que eu conheço à face da terra, contando com a minha madrinha como aliada, meteu-se num comboio, e apareceu ao meu pai na Pastelaria Suissa, quando ele tomava chá com a "dita"!!! Rezam as "crónicas familiares" que foi a última vez! A minha mãe, como boa ciumenta, não deve ter deixado o "crédito em mãos alheias"!
Esta faceta de D. Juan do meu pai sempre me divertiu, e não consigo vê-la como um facto negativo. Encaixa tão bem na sua personalidade que seria um "crime" não a exaltar, não a contar, não gostar dela ou, até escondê-la.
Enquanto estive a escrever este post, o meu pai "passeou-se" à minha frente, com o seu ar de "sacana", os seus olhares provocadores e as suas "falas" doces, de braço dado com algumas das suas "mulheres"... e ele tinha um ar tão feliz, mas tão feliz, que até eu fico de lágrima ao canto do olho, perante este testemunho de "amor" pelas mulheres!
*Nota histórica: Em Outubro de 1910, a Companhia de Jesus foi, pela terceira vez, expulsa e espoliada dos seus bens, em Portugal. O governo provisório da República restaurou a Lei pombalina de 1759. Após terem abrigo temporário na Holanda e na Bélgica, estabeleceram-se na vizinha Espanha, onde abriram, entre outros, o Colégio para alunos portugueses em La Guardia, no lado espanhol da foz do Rio Minho. Foi este, o "herdeiro" do famoso Colégio de Campolide, sendo em 1932 transferido para as Caldas da Saúde, Sto Tirso.)
Sem comentários:
Enviar um comentário