segunda-feira, 21 de março de 2011

Lost

Perdido. É assim que o sinto.
Senti-o perdido ao telemóvel, vi-o perdido quando saiu da ambulância. Os olhos postos nela, na companheira dos últimos vinte e quatro anos. Não passaram uma única noite separados nesses anos. Estiveram lado a lado todas as manhãs, todas as noites. Partilharam as dores, as alegrias, as mágoas, as zangas e as doenças.

Conheceram-se cedo e encontraram o amor tarde, quando ambos achavam que já não era possível. Acompanhei o inicio, vi a relação crescer, vi-os enfrentar os seus próprios medos, vi-os construir a relação que têm. Foi comigo que falaram quando se quiseram casar.
Conheço-a muito bem, tão bem como as palmas das minhas mãos e sei que encontrou nele tudo o que sempre quis: um companheiro, um amigo, alguém com quem partilhasse tudo, de igual para igual. E ele encontrou nela a força, o pilar, a companheira que não tinha tido a vida inteira.

Nunca o senti perdido. A sua vida tinha um única propósito: ELA! Todo o seu dia girava à volta dela: o que ela queria, o que a fazia feliz, as mezinhas que lhe tiravam as dores imaginárias, as revistas que gostava, os cigarros que lhe aturava, as fobias e os medos que a prendiam e amarravam aquela cidade, aquela casa. Ele tinha uma missão: tornar-lhe a vida mais fácil e a velhice mais doce.

Perdêmo-la durante umas horas. Mas pior do que a ter "perdido", foi vê-lo perdido. A ela, sabia bem o que tinha que fazer, para a tentar ter de volta, mas e a ele?! Nunca me foi tão difícil encontrar palavras, porque não eram as minhas que ele queria, que ele precisava. Não eram as minhas mãos que ele queria, nem o meu abraço que o consolava.

Naquela sala de espera, numa madrugada gelada, os seus pés arrastavam-se não de frio nem de cansado mas sim porque não tinham rumo, nem destino. Depositou em mim todas as decisões e abandonou-se à dor de lha terem arrancado dos braços. Não falou muito, não chorou, mas os seus ombros caídos, os seus olhos vazios, os seus passos arrastados gritavam-me: e agora, o que vai ser de mim sem ela?

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